Não se defende o Estado Democrático de Direito cooptando e usurpando atribuições dos outros poderes
- Pedro Papastawridis

- 25 de set. de 2023
- 6 min de leitura
Desde que Lula foi eleito e os Três Poderes constitucionais (Legislativo, Executivo e Judiciário) foram alvos da vândalos que invadiram prédios públicos de Brasília em 08 de janeiro deste ano, Lula e Supremo Tribunal Federal (STF) vêm promovendo uma caçada a quem participou, promoveu e/ou financiou tais atos antidemocráticos.
No entanto, é preciso separar os usos dos abusos que Executivo e Judiciário vêm fazendo de suas funções constitucionais sob o pretexto de “defender a democracia brasileira”, mormente em relação à forma como lidam com o Poder Legislativo (Câmara dos Deputados e Senado Federal). Assim, o Blog do Papa elencará neste texto 4 indícios de que Lula e STF vêm subvertendo o Estado Constitucional (no qual um dos pilares é a teoria da separação dos poderes de Montesquieu) mediante cooptação e usurpação de atribuições do Poder Legislativo.
Indício 1 – Emprego da estratégia política do “toma-lá-dá-cá”
Com a pulverização das bancadas dos partidos ao longo das últimas décadas, montar uma base de apoio aos projetos governamentais tornou-se uma missão dificílima, mas não impossível para os governantes. Apesar disso, desde 2003 que os sucessivos Presidentes da República que assumiram o Brasil (Lula, Dilma, Temer, Bolsonaro e Lula novamente neste ano) optaram pelo caminho mais curto em busca da governabilidade, porém mais prejudicial ao interesse público e ao bem comum: a política do "toma-lá-dá-cá".
Em linhas gerais, o toma-lá-dá-cá consiste num mecanismo de cooptação de apoio parlamentar em que o Chefe do Poder Executivo barganha cargos públicos e distribuição de verbas para redutos eleitorais de grupos políticos em troca dos votos de deputados federais e senadores em projetos de interesse do governo. O problema dessas práticas reside justamente: na falta de critérios claros, objetivos, precisos e meritocráticos na nomeação de indicados para ocupação de cargos; e de projetos consistentes e controles efetivos na alocação dos recursos distribuídos pelo governo em muitas das emendas parlamentares apresentadas. Basta olharmos para a história política do Brasil nos últimos 20 anos, que logo nos depararemos com diversos esquemas de corrupção advindos da política do toma-lá-dá-cá: Mensalão, Petrolão, compra de tratores superfaturados por meio de emendas parlamentares, etc.
No caso do toma-lá-dá-cá, a responsabilidade por tal prática perniciosa não começa e termina no Presidente da República. Quem aceita entregar seu voto ou seu apoio em troca de indicações para cargos públicos e/ou recursos para redutos eleitorais também consente com os malefícios resultantes dessa prática fisiológica. Logo, de nada adianta um parlamentar fazer discursos pomposos nos púlpitos do Congresso Nacional, postar frases de efeito nas redes sociais e divulgar vídeos bancando o arauto da moralidade, se barganha cargos e verbas por trás dos panos. Isso não só é imoral, como beira a canalhice, além de submeter o Poder Legislativo aos desígnios do Poder Executivo, ferindo a independência e a harmonia entre os Poderes a que se referem o art. 2º de nossa Constituição Federal de 1988.
Indício 2 – Abertura de representações e/ou investigações contra desafetos políticos na Câmara e no Senado
Desde que Lula assumiu o poder pela terceira vez no Brasil, tornaram-se frequentes os ataques de seus auxiliares diretos, como os Ministros da Justiça (Flávio Dino) e dos Direitos Humanos (Sílvio Almeida), contra parlamentares que criticam atos e omissões do Governo Federal.
Um exemplo disso vimos recentemente em relação aos deputados federais Nikolas Ferreira (PL-MG) e Filipe Barros (PL-PR), além do senador e ex-juiz Sérgio Moro (União Brasil-PR), que foram acusados pelo Ministro dos Direitos Humanos de estarem "propagando fake news" acerca de norma governamental que orienta sobre a instituição de banheiros unissex nas escolas. Não obstante as acusações feitas por Sílvio Almeida aos citados parlamentares, o Ministro dos Direitos Humanos, que se calou quando Lula defendeu ditadores como Nicolás Maduro (Venezuela) e Vladimir Putin (Rússia), ameaçou acionar a Advocacia-Geral da União contra os três integrantes do Poder Legislativo, por opinarem em desfavor do referido ato administrativo. Eis o Ministro dos Direitos Humanos do Governo Lula...
Indício 3 – Uso de veículos de comunicação alinhados e de influenciadores para criticarem e descredibilizarem opositores
Quem assiste aos diversos canais de notícias de nosso país, já deve ter se deparado com alguns jornalistas e comentaristas que ficam o tempo todo "tentando decifrar" o que o Governo Federal disse ou fez. Até aí, nada demais, até porque fazer a leitura e a interpretação dos fatos políticos faz parte do ofício desses profissionais da imprensa.
No entanto, tem sido uma constante nos principais veículos de comunicação do Brasil a existência de jornalistas e comentaristas especializados em "mandar recados" ou trazer fatos e dados negativos de opositores do Governo Federal e, até, de desafetos de Ministros do STF. Um exemplo dessa prática vemos em alguns profissionais que chegam a sorrir e ficar com os olhos brilhando quando falam de figuras como Jair Bolsonaro e o ex-juiz da Operação Lava Jato, senador Sérgio Moro. Para esses jornalistas e comentaristas, a "lacração" somada à vontade de "ficar bem na foto" com o Governo Lula e o STF parecem valer mais que a isenção e a imparcialidade essenciais à boa atividade jornalística.
Indício 4 – Aplicação reiterada pelo STF de entendimentos que contradizem o Poder Legislativo no tocante a matérias já discutidas e deliberadas na Câmara e no Senado
Conforme já citado por este blog em artigo publicado em 09/08/2023, ganhou destaque na mídia nacional nas últimas semanas um julgamento em curso STF acerca da flexibilização de dispositivos da Lei Nacional Antidrogas (Lei n° 11.343/2006) que tratam do porte e uso de drogas para consumo próprio. Trata-se de um julgamento cujo resultado terá repercussão geral no âmbito do Poder Judiciário, o que abre as portas gradualmente para a liberação do mercado de drogas no Brasil.
Tal julgamento, que fere a teoria da separação dos Poderes de Montesquieu, segundo a qual o poder de legislar compete ao Poder Legislativo, tem o potencial de agravar o cenário de insegurança pública em nosso país, na medida em que os financiadores do narcotráfico (os usuários) estarão isentos de criminalização por porte e uso de drogas, isso sem falar no abrandamento de penas de pessoas que foram condenadas por envolvimento com o tráfico de drogas, já que a Lei (nesse caso, uma jurisprudência fruto da usurpação de poderes legislativos pelo Poder Judiciário) pode retroagir em nosso ordenamento jurídico para beneficiar o réu.
Entretanto, tal avocação de funções típicas do Poder Legislativo pelo STF não vem se resumindo à questão da legalização do porte e do consumo de drogas. Outros temas também já discutidos e votados pelo Congresso Nacional também tiveram a vontade do legislador desprezada pela Suprema Corte do nosso país, caso da contribuição sindical, cuja reforma trabalhista promovida em 2017 (Lei 13.467/2017) estabeleceu no art. 579 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que o desconto dessa contribuição está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão. Após recente julgamento do STF, tal cobrança por parte dos sindicatos foi facilitada, além de essas entidades poderem cobrar até 1% do salário anual do empregado (antes da Reforma Trabalhista, o desconto era de 1 dia de salário a cada ano, o que dava menos de um terço da contribuição autorizada pelo STF.
Em suma, o que foi descrito acima evidencia não só o esvaziamento de um Poder por parte dos outros dois Poderes, mas sobretudo um risco de total ruptura do Estado Democrático de Direito, na medida em que Lula e STF relativizam, conforme oportunidade e conveniência do projeto de poder a que servem, a separação entre os Poderes formulada por Montesquieu e que serve de base para os Estados Constitucionais atuais. Sem o respeito pleno ao Estado Democrático de Direito, a defesa da democracia não passará de um paradoxo e de pretexto de alguns canalhas e projetos de ditadores para promoverem o atraso civilizacional brasileiro, enquanto esses mesmos canalhas e projetos de ditadores curtem o que há de melhor em civilizações apoiadas nos valores democráticos que aqueles tanto desprezam em nosso país.
Todo poder emana do povo e a este deve servir. Ou o povo sai de dentro da caverna de Platão e assume as rédeas do poder, ou todos viveremos eternamente dentro dessa caverna em que canalhas e projetos de ditadores tentam nos manter aprisionados “em defesa da democracia”.
Um forte abraço a todos e fiquem com Deus!





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