No país do governo conservador na economia e liberal nos costumes, lavagem de dinheiro é refresco!
- Pedro Papastawridis

- 14 de out. de 2020
- 3 min de leitura
Pense numa instituição em que os controles internos são deficientes, a contabilidade é duvidosa e a fiscalização pelo Estado é ineficaz. Também pense que essa mesma instituição tem o poder de seduzir e atrair milhões de pessoas dispostas a renunciar a seus bens, a suas famílias e a suas vidas para continuarem colocando dinheiro nessa instituição, acreditando que, num dia, conquistarão a glória eterna.
Se você pensou numa igreja ou num partido político, a resposta não está errada, a depender da instituição em que você pensou. Porém, estamos nos referindo ao mercado de cassinos e bingos, cuja legalização e regulamentação interessa a parlamentares das mais variadas crenças políticas no Congresso Nacional, convertendo o que é ilícito no Brasil em lícito.
Quando se pensa em legalizar algo considerado ilícito até então, é preciso fazer três questionamentos essenciais:
1. Quem está propondo isso?
2. Quem se beneficiará com os efeitos futuros dessa medida?
3. Quem se beneficiará dos possíveis efeitos retroativos dessa medida?
Para responder a primeira pergunta, é preciso pensar no pesado lobby que ocorre nos mais variados gabinetes de Brasília. Nesse âmbito, estamos falando de: donos de cassinos que operam em paraísos fiscais; bicheiros; doleiros; pessoas com ligações com o tráfico de drogas e com as milícias; e de agentes políticos que querem atender compromissos pactuados com investidores e Estados estrangeiros. Para ilustrar o disposto aqui, basta pensarmos que donos de cassinos de Nevada e investidores com escritórios em Delaware têm sondado parlamentares brasileiros em missões oficiais pelos Estados Unidos e enviado emissários para acompanhar as discussões em torno da matéria em Brasília. Ademais, o próprio Presidente Trump, que possui fortes ligações com magnatas do ramo de cassinos, vê com bons olhos a abertura desse mercado no Brasil. E Trump só apoia algo fora dos estados Unidos se for bom para os negócios e amigos dele.
Para quem não sabe onde ficam Nevada e Delaware, estamos falando de dois estados americanos considerados paraísos fiscais. Um pouco mais sobre esses dois estados você pode ler nesta reportagem da BBC: <https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/04/160407_americanos_paraisos_fiscais_lgb>.
No que tange à segunda pergunta, podemos elencar dois grupos que realmente se beneficiarão da legalização dos cassinos e bingos no Brasil: quem vai investir nesse mercado e quem busca um porto seguro para lavagem de dinheiro. Para quem investe nesse negócio, a rentabilidade costuma ser alta e o payback descontado relativamente baixo, com prazo de retorno de até 2 anos na maioria dos casos. Já para quem busca dar aparência de licitude para recursos obtidos de maneira lícita, cassinos e bingos facilitam essa prática, pois lidam com muito dinheiro entregue em espécie e sem qualquer controle fiscal. Com isso, torna-se fácil manipular registros contábeis, abrindo caminho para o branqueamento de capitais por meio de uma roleta ou de uma mesa de Pôquer.
Em relação à terceira pergunta, é preciso pensar nos efeitos jurídicos da legalização de um mercado que existe e vem operando de maneira ilícita no país há tempos. Apesar da repressão policial que vemos diariamente contra cassinos e bingos que operam clandestinamente, esse mercado ainda opera de maneira intensa à margem do Estado brasileiro, contando, muitas vezes, com a proteção de agentes públicos. Em vista disso, bilhões de reais que são manipulados por criminosos podem, da noite para o dia, deixar de ser considerados ilícitos e passarem a ser tratados como lícitos, aliviando penas e transformando traficantes, milicianos e bicheiros em “empreendedores”. Basta a nova Lei retroagir para beneficiar o réu, o que encontra respaldo na Constituição Federal de 1988. Em outras palavras, a legalização de negócios como cassinos, bingos e venda de drogas pode converter figuras como Marcola, André do Rap e o miliciano Ecko em “empresários”.
Obviamente, quem defende a legalização das atividades supracitadas alega que o “Estado falhou” em sua tarefa de reprimir esses negócios e que a legalização vai gerar empregos, renda e tributos para o Estado brasileiro. Tal argumento tem sua parcela de verossimilhança. Mas é preciso olhar para a floresta inteira, e não somente para uma única árvore quando pensamos em legalizar cassinos e bingos. Não nos esqueçamos dos impactos socioeconômicos do vício da jogatina, do perigo de legalizar negócios que atualmente estão nas mãos de criminosos e do risco para o Estado Democrático de Direito de facilitar a lavagem de dinheiro em solo nacional. Afinal de contas, o crime organizado busca guardar seus recursos onde não haverá risco de ser rastreado e ter seus bens confiscados. E a legalização de cassinos e bingos no Brasil terá o condão de transformar o nosso país em porto seguro para operações financeiras de narcomilicianos, traficantes de armas, pedófilos e políticos e governos corruptos.
Diante do exposto, fica o alerta. Ou se combate esse pesado lobby da jogatina e se corta o mal pela raiz, ou se assume o risco de o Brasil se tornar pelas mãos de um governo conservador na economia e liberal nos costumes a terra do pecado.
Um forte abraço a todos e fiquem com Deus!





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