Conflito entre Rússia e Ucrânia e possíveis impactos socioeconômicos para o Brasil
- Pedro Papastawridis

- 14 de fev. de 2022
- 4 min de leitura
Nos últimos dias, muito se tem falado acerca da escalada nas tensões entre russos e ucranianos, com Estados Unidos, União Europeia e China atuando diplomaticamente e pragmaticamente nos bastidores desse conflito. Mas como isso pode acabar respingando em nosso país e, por conseguinte, agravar a nossa situação socioeconômica?
Sobre a Rússia, muitos de nós que estudamos Guerra Fria e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) conhecemos a história dessa que é a maior nação global em termos territoriais, com uma superfície equivalente a dois Brasis.
E quanto à Ucrânia? O que podemos dizer sobre ela?
Além de ser o país onde está situada a extinta usina nuclear de Chernobyl, cenário de um dos maiores desastres nucleares da história da humanidade, a Ucrânia é uma das ex-repúblicas da extinta URSS, tendo feito parte desta entre 1922 e 1991. No início da URSS, na década de 1930, a população do atual território ucraniano quase foi dizimada pelo Holodomor (a Grande Fome), tendo milhões de pessoas morrido por inanição devido a uma política de extermínio comandada por Joseph Stalin.
Atualmente, a Ucrânia é uma nação independente, com uma área territorial de cerca de 600.000 km2, equivalente à do estado de Minas Geras, porém com uma população que equivale ao dobro da população do estado mineiro. Com quase 43 milhões de pessoas, a Ucrânia é um dos países mais populosos da Europa, servindo de elo logístico entre a União Europeia e o território russo. Não por acaso, grande parte da produção de gás natural que os russos enviam para a Europa Ocidental passa por gasodutos que cortam o território ucraniano. E isso ajuda a explicar o interesse da União Europeia numa solução pacífica do conflito entre russos e ucranianos.
Em 2014, forças russas invadiram e anexaram a Crimeia, então território ucraniano situado no Mar Negro. Na ocasião, o presidente russo, Vladimir Putin, defendeu a anexação da Crimeia sob o argumento de que essa região possuía ligações históricas com a Rússia. Desde então, Estados Unidos e União Europeia estreitaram laços com os ucranianos e impuseram diversas sanções econômicas aos russos, o que tem contribuído para a manutenção das tensões entre estes e os ucranianos.
Entretanto, parece que esse barril de pólvora que envolve Moscou e um de seus ex-territórios soviéticos está prestes a explodir, motivado pela aproximação crescente de Kiev em relação à União Europeia e à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), principal organismo de defesa militar do Ocidente. Como os russos ainda enxergam as demais ex-repúblicas soviéticas como zona de influência de Moscou e jamais engoliram o ingresso de Estônia, Letônia e Lituânia na União Europeia, tornou-se uma “questão de honra” para Vladimir Putin garantir que a Ucrânia se submeta aos desígnios da Rússia.
Para a União Europeia, evitar um conflito entre Rússia e Ucrânia não se resume somente a conter o avanço militar e territorial de russos em direção à parte ocidental da Europa. Também envolve garantir o suprimento de um item essencial para o continente europeu aquecer a economia local e os lares durante os dias de frio: o gás natural.
Em caso de um conflito militar na Ucrânia, parte do gás que serve de combustível para indústrias e residências europeias pode não chegar na parte ocidental do continente, provocando a escassez de insumos energéticos e de bens e serviços que dependem do gás natural e, consequentemente, a inflação de custos em diversos países europeus, isso sem falar no risco de muitas pessoas morrerem de frio devido à escassez do gás e ao encarecimento da energia. E outros grandes produtores de gás natural, como Estados Unidos, Canadá, Noruega e Oriente Médio, não teriam condições logísticas em tão pouco tempo de suprirem a falta do gás russo a contento e com preços similares aos praticados pela Rússia em solo europeu.
Quanto aos Estados Unidos, o avanço russo sobre a Ucrânia representaria mais um duro golpe na diplomacia e geopolítica que vêm sendo conduzidas por Washington desde que Joe Biden assumiu o governo americano, o que se somaria à vergonhosa saída das tropas ianques do Afeganistão em agosto de 2021. Isso sem falar que encorajaria Moscou a avançar sobre outras ex-repúblicas soviéticas, como Estônia, Letônia e Lituânia, além de motivar a China, aliada dos russos, a avançar militarmente sobre regiões como Hong Kong e Taiwan.
E quanto ao Brasil? Como ficamos nessa história?
Em caso de conflito militar no Leste Europeu, muitos recursos que nosso país importa dessa região do planeta podem ficar indisponíveis ou chegarem aqui com preços muito mais elevados, caso dos fertilizantes russos, considerados fundamentais para o incremento da produção agrícola brasileira. Além disso, commodities como petróleo e gás natural podem ver suas respectivas cotações dispararem, encarecendo ainda mais a importação desses produtos pelo nosso país e elevando os preços dos derivados de petróleo nas refinarias brasileiras. E isso logo se refletiria nas bombas dos postos de combustíveis e na conta do gás que chega em nossas residências. E combustível mais caro significa mais inflação e agravamento da pobreza e das disparidades sociais no Brasil.
Por fim, não podemos esquecer do impacto desse conflito entre Rússia e Ucrânia a curto e médio prazos na cotação do dólar e do euro, que também poderiam disparar em solo brasileiro, além da fuga de capitais de países emergentes como o Brasil em direção a economias mais desenvolvidas. E fuga de investimentos representa menos formação bruta de capital fixo, que representa perda de competitividade do nosso país em diversos setores da economia, que representa perda de mercados, de PIB e, por conseguinte, de postos de trabalho e renda para as famílias.
Diante do exposto, o momento é de cautela e de aprofundamento por empresas e governo brasileiro das medidas de hedge quanto aos impactos macroeconômicos da escalada militar da Rússia contra a Ucrânia. Pode ser que ambos os países do Leste Europeu cheguem a um inesperado acordo, ceteris paribus. Mas tudo indica que o frio e calculista Vladimir Putin não retrocederá em seu projeto geopolítico de recuperação da influência russa sobre ex-repúblicas soviéticas, incluindo os países que hoje estão mais próximos de Bruxelas que de Moscou. E que o inverno passe logo...
Um forte abraço a todos e fiquem com Deus!





Comentários