Pandora Papers: Guedes e seu patrão têm mais a falar do que silenciar sobre as Ilhas Virgens
- Pedro Papastawridis

- 4 de out. de 2021
- 4 min de leitura
Imagine uma situação em que o dono de uma empresa chega para seu Diretor Financeiro e o encarrega de aplicar milhões de dólares em qualquer aplicação que decidir, sem se importar se esse investimento renderá lucros ou prejuízos para a instituição. Também imagine que esse Diretor Financeiro é dotado de certos desvios de conduta, buscando a todo momento oportunidades de beneficiar mais a si próprio e a seus amigos do que a instituição que paga seus salários.
Diante dessa combinação de elementos, o que você crê que o Diretor fará com a “carta branca” que recebeu para investir milhões de dólares da empresa?
A situação acima soa um tanto absurda, principalmente se pensarmos que nenhum empresário “joga para perder” assumindo os riscos de dar carta branca para seus comandados fazerem o que quiserem com o dinheiro da instituição. Mas é o que vem ocorrendo com a Empresa Brasil neste exato momento, sendo os mais de 210.000.000 de sócios dessa empresa os principais prejudicados pela decisão de seu gestor financeiro, isto é, Ministro Paulo Guedes.
Ao longo do dia de ontem (03/10/2021), ganhou destaque na mídia nacional a divulgação do Pandora Papers, série de reportagens do ICIJ (sigla em inglês do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos) que trata de investigações jornalísticas sobre finanças internacionais e paraísos fiscais.
No caso do Pandora Papers, as investigações envolveram mais de 600 jornalistas de centenas de veículos de comunicação espalhados por todo o mundo e análises de mais de 11,9 milhões de documentos que tratam de operações financeiras nos seguintes paraísos fiscais entre 1990 e 2019: Ilhas Virgens Britânicas, Nova Zelândia, Hong Kong e Cingapura. No Brasil, por exemplo, fizeram parte da apuração jornalistas:
· Do Poder360 (Fernando Rodrigues, Mario Cesar Carvalho, Guilherme Waltenberg, Tiago Mali, Nicolas Iory, Marcelo Damato e Brunno Kono);
· Da revista Piauí (José Roberto Toledo, Ana Clara Costa, Fernanda da Escóssia e Allan de Abreu);
· Da Agência Pública (Anna Beatriz Anjos, Alice Maciel, Yolanda Pires, Raphaela Ribeiro, Ethel Rudnitzki e Natalia Viana); e
· Do site Metrópoles (Guilherme Amado e Lucas Marchesini).
Desse esforço jornalístico colaborativo, resultou a identificação nos quatro países de mais de 40.000 beneficiários de quase 70.000 offshores (empresas sediadas no exterior, usadas por pessoas físicas ou jurídicas para promoverem negócios internacionais e/ou planejamento tributário, mediante declaração à Receita Federal e ao Banco Central).
Dentre os beneficiários identificados nas apurações supracitadas, constam celebridades, desportistas, lideranças políticas e figuras controversas a nível global. No caso brasileiro, por exemplo, o Pandora Papers identificou offshores sediadas nas Ilhas Virgens Britânicas registradas em nome do atual Ministro da Economia (Paulo Guedes) e do Presidente do Banco Central brasileiro (órgão regulador do Sistema Financeiro Nacional).
Frise-se que possuir uma offshore não é ilegal. O que soa ilegal e, sobretudo, imoral é quando o beneficiário desse tipo de empresa é uma figura pública que mantém a offshore e maximiza os ganhos delas com base em informações obtidas e/ou decisões tomadas no cargo que ocupa.
No caso de Paulo Guedes, os ganhos de sua empresa nas Ilhas Virgens Britânicas envolvem a valorização cambial do dólar desde que ele assumiu o comando do Ministério da Economia. Em reportagem publicada no site da revista Piauí ontem, o então sócio da Bozano Investimentos teria aberto em 25/09/2014 a Dreadnoughts International, uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas. Nos meses seguintes à fundação dessa empresa, Guedes aportou na conta da Dreadnoughts a quantia de 9,55 milhões de dólares, o equivalente a 23 milhões de reais na época, sendo que ele ainda detém o controle dessa empresa.
Em vista disso, Paulo Guedes, que é um dos responsáveis por formular e implementar políticas econômicas que impactam no câmbio, teve uma valorização de seu patrimônio na Dreadnoughts de quase R$ 14,69 milhões entre janeiro de 2019 e setembro deste ano (segundo o dólar médio mensal apurado pelo Ipea Data), cerca de 41,11% de valorização em pouco mais de 30 meses. E isso somente por conta da valorização do dólar frente ao real, valorização essa que vem impactando na inflação de custos das cadeias produtivas nacionais, na perda de poder aquisitivo das famílias brasileiras e no aumento da fome e da miséria por todo o país.
Em tempo, talvez esse patrimônio nas Ilhas Virgens Britânicas ajude a explicar o porquê de Paulo Guedes criticar tanto políticas cambiais apoiadas em dólar baixo, bem como as pobres empregadas domésticas que se beneficiavam dela. Coincidência ou não, o real também é uma das moedas que mais se desvalorizaram em relação ao dólar desde que Guedes assumiu o Ministério da Economia de Jair Bolsonaro.
À luz do exposto, cabe à população pressionar as autoridades competentes para mapearem e investigarem demais operações econômico-financeiras envolvendo offshores de agentes públicos, cobrarem explicações desses agentes e exigirem de Paulo Guedes e seu patrão Jair Messias uma reparação do povo brasileiro pelos impactos que essa política cambial vem causando ao bolso dos quase 210.000.000 de brasileiros que não possuem dólar, tampouco offshores em paraísos fiscais para se protegerem das oscilações cambiais. Afinal de contas, não são os quase 210.000.000 de sócios da Empresa Brasil que devem pagar a conta da política de dólar alto bancada por Guedes e Bolsonaro. E Guedes e seu patrão têm mais a falar do que silenciar sobre as Ilhas Virgens.
Um forte abraço a todos e fiquem com Deus!





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