PEC dos Precatórios e o estrago causado no Brasil a médio e longo prazos
- Pedro Papastawridis
- 4 de nov. de 2021
- 3 min de leitura
Imagine que você é credor de uma dívida com o Estado brasileiro e que está há anos tentando resgatar esses recursos, tendo esgotado as vias administrativas de negociação e passado mais alguns anos se consultando e sendo assistido por um advogado para obter esse dinheiro pela via judicial.
Após seu processo tramitar na 1ª, na 2ª e na 3ª instâncias, finalmente é julgado no Supremo Tribunal Federal (STF), onde tramitou mais alguns anos em meio a recursos e vistas de processo para, enfim, transitar em julgado. Nesse momento, você respira fundo e, aliviado, pensa:
- Finalmente, poderei receber o que é meu em vida!
Isso ajuda a entender um pouco a Via Crúcis que milhares de pessoas e empresas enfrentam todos os anos para receberem pagamentos devidos pela Fazenda Pública, sendo o precatório uma espécie de requisição de pagamento que o Estado brasileiro foi condenado a pagar em processo judicial.
Porém, a Via Crúcis de muitos brasileiros parece que não terminará no trânsito em julgado no STF, a depender do oportunismo político-eleitoral de deputados federais, senadores e de Jair Messias Bolsonaro. E isso se deve à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 23/2021, também conhecida como PEC dos Precatórios, que limita o valor de despesas anuais com precatórios, corrige seus valores exclusivamente pela taxa Selic e muda a forma de calcular o teto de gastos.
No momento em que este texto é redigido, a PEC se encaminha para o 2º turno de votação na Câmara dos Deputados, necessitando de mais 308 votos dos deputados federais para seguir para votação em mais dois turnos no Senado Federal. Todavia, a tramitação da PEC é o que menos importa neste momento. O mais relevante é o estrago que uma proposta dessas pode causar nas contas públicas, na credibilidade do Brasil e na economia nacional a médio e longo prazos.
O argumento que figuras como Jair Messias e Arthur Lira utilizam para defender essa postergação de pagamento de dívidas líquidas e certas da União é o de que a manobra fiscal abrirá espaço para ampliação dos valores pagos a título de transferência de renda para famílias em situação de risco social, caso dos beneficiários do Bolsa Família. Entretanto, ao usarem os pobres como pretexto para “pedalar” gastos públicos, Bolsonaro e Lira buscam somente a sobrevivência política de ambos a menos de um ano das Eleições de 2022, usando a velha estratégia do “pão e circo (político)” para garantir o retorno de ambos a Brasília em 2023.
Embora pareça difícil entender o tamanho do estrago causado por mais uma postergação de pagamento de dívidas que a União está obrigada a pagar por decisão judicial, basta pensarmos no nosso próprio orçamento familiar. Se sabemos que possuímos gastos recorrentes a pagar, o bom pagador vai trabalhar para garantir os recursos que honrarão seus compromissos financeiros, ou cortará alguns gastos para gerar uma gordura orçamentária que pague os demais compromissos. Sem isso, haverá o endividamento crescente, levando o bom pagador à insolvência e, por conseguinte, à perda de credibilidade e crédito perante os credores.
No caso do Brasil, a postergação do pagamento de precatórios abrirá espaço para gastos com assistência social em 2022, mas reduzirá a gordura orçamentária nos anos subsequentes, deixando para o próximo Presidente da República o rombo fiscal. Somado a isso, teremos a saída de recursos estrangeiros por conta da perda crescente de credibilidade do Brasil, levando ao aumento do dólar, além da fuga de ativos financeiros e intelectuais essenciais ao desenvolvimento da economia brasileira. Dessa convergência de eventos, resultarão a inflação descontrolável, o aumento do desemprego e, por conseguinte, o empobrecimento ainda maior da população brasileira.
Se Bolsonaro e Lira realmente se importam com os pobres, deveriam agir com mais responsabilidade fiscal e se consultar com os técnicos que os assessoram. Exemplo disso é o relato do diretor da Instituição Fiscal Independente, Felipe Salto, segundo o qual é possível obter os recursos necessários para turbinar o Bolsa Família somente com o enxugamento de gastos discricionários, com o direcionamento de parte das emendas individuais e de bancada para o gasto social e com a correção contábil dos precatórios do Fundef. Com essas três medidas, Felipe Salto afirma que é possível gerar uma economia de R$ 35 bilhões, dinheiro suficiente para dobrar o orçamento do Bolsa Família em 2022. Mas para Jair e Lira a mamata de seus pares não pode parar, ainda que isso custe o caos econômico-social do país a médio e longo prazos.
Diante do exposto, a sociedade brasileira precisa conter essa aventura populista dos presidentes da Câmara e da República antes que não reste muito de uma sociedade brasileira. Pois é na desordem e no caos que oportunistas como Arthur Lira e Jair Bolsonaro prosperam.
Um forte abraço a todos e fiquem com Deus!
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